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13/06/16 | Sonia Pestana – Interlocutora Coremetro

O poder transformador da arte

Sentenciado cria e recria obras de arte a partir de peças de ferro da antiga estrutura da unidade prisional

Graças à curiosidade, determinação e criatividade, o sentenciado A.H.P.S., de 61 anos, que cumpre pena no Centro de Detenção Provisória “Willians Nogueira Benjamin”, de Pinheiros II, vem preenchendo muito bem seu longo período de encarceramento para produzir arte. Com grande parte de seu tempo ocupado com a manutenção da unidade prisional, o sentenciado reserva alguns momentos livres para a criação.

Graças à habilidade, o sentenciado cria e recria variadas peças, desde abajures feitos com correntes soldadas, aranha e sua teia, engenhosamente feitas com ferro, até retrato de cena do pica-pau em sua casa e uma biga romana. Autodidata, ele descobriu seu potencial quando tinha apenas 11 anos, quando desmontou e montou uma fechadura da casa de sua família.

Segundo A.H.P.S., o problema no trinco da porta o incomodava, já que a peça vivia emperrada. Foi a partir daí, com a união da curiosidade e da criatividade, que ele conseguiu resolver o entrave. Diante do feito, ele relembra que recebeu elogios do pai, que ficou admirado com a sua inteligência.

Na adolescência fez curso técnico de mecânica e acabou trabalhando com caldeiras e aquecedores. “Sou perfeccionista e fui descobrindo como eram feitas as caldeiras”, revelou. De acordo com ele, sua curiosidade o levou a criar caldeiras próprias, a partir do conhecimento adquirido.

Ao lembrar-se do passado, o sentenciado sorri ao dizer que quando era metalúrgico, em uma fábrica de máquina de raspar tacos, certo dia teve de substituir um colega de trabalho, cuja máquina ele desconhecia completamente. O resultado não poderia ter sido outro: apesar do pouco conhecimento na área; ele revelou que acabou ficando no lugar de Jesus, nome do empregado que foi logo afastado da função.

Trabalho no CDP

Com os olhos marejados, A.H.P.S. lembra que quando chegou ao CDP Pinheiros II, há cerca de seis anos, queria ocupar sua mente. Ele relatou que, ao ouvir a conversa entre dois servidores sobre a necessidade de serralheiro para fazer uma porta, não pensou duas vezes ao se apresentar para o trabalho na unidade, mesmo sem nunca ter feito tal peça.

Hoje, sua perícia na serralheria lhe rendeu fama com os vizinhos e também o apelido carinhoso de professor Pardal. Por formar um complexo de quatro unidades prisionais, é comum encontrar os bem acabados trabalhos de serralheria nos CDPs de Pinheiros I, II, III e IV, a exemplo de bancos para as visitas, corrimão, estruturas do jardim vertical, cabides com flores de metal ou as perfeitas estruturas da mesa de reuniões do setor de saúde.

Mas engana-se quem pensa que suas criações estão restritas às peças de uso diário nas unidades de Pinheiros. Ao longo desses anos de criação, o sentenciado enumerou inúmeras obras que foram presenteadas a personalidades de renome que visitaram a unidade prisional, a exemplo do arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer, e do Dr. Dráuzio Varella. O Museu Penitenciário, instalado no bairro de Santana, também conta com algumas obras de sua autoria.

Desafios que viraram paixão

Anos antes de entrar no sistema prisional, movido igualmente por desafios, A.H.P.S. cursou iatismo. Segundo seu relato, participou por oito anos de competições pela classe Day Sayler, o que possibilitou conhecer grandes nomes do esporte náutico.

Em outra fase de sua vida, já no CDP Pinheiros II, o sentenciado revelou que sentia necessidade de ocupar ainda mais sua mente. Pensou e então optou por estudar inglês por conta própria, algo que, em sua opinião, era algo difícil e que exigiria concentração e empenho. Assim, ele disse que passou a trabalhar com frases prontas para o dia a dia, anotando essas palavras em um quadro negro afixado na área de manutenção da unidade. Aliado a isso, o professor Pardal do CDP de Pinheiros II faz uso de áudio de aulas de inglês, disponível na biblioteca.

Semanalmente, o recluso escolhe uma frase, pesquisa seu significado e a fonética, para então trabalhar com essa nova descoberta. Nessa dinâmica, que se repete há anos, ele vem conseguindo resultados surpreendentes. Segundo A.H.P.S., hoje é possível se comunicar com certa destreza com visitantes estrangeiros. Em sua opinião, parte do mérito deve-se ao diretor geral da unidade, Guilherme Silveira Rodrigues, seu principal e incansável incentivador.

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